RECOMENDAÇÃO DE ADUBAÇÃO FOSFATADA PARA A CANA-DE-AÇÚCAR ATRAVÉS DA ANÁLISE QUÍMICA DO SOLO (1)
ERMOR ZAMBELLO JR.*
J.ORLANDO
FILHO **
ARNALDO
A. RODELLA ***
RESUMO
O alto custo dos fertilizantes condiciona a
recomendação dos mesmos em quantidades necessárias e suficientes para a
obtenção da produção máxima econômica das culturas. A avaliação da disponibilidade
dos nutrientes no solo, através da análise química do mesmo, reveste-se de
fundamental importância.
O presente trabalho apresenta os resultados
do estudo de calibração da análise do solo para f6sforo. Obteve-se a curva de
calibração, através da correlação entre o P do solo, extraído com H2SO4
0,5N e a produção relativa de cana obtida em 34 ensaios de campo. O coeficiente
de correlação da curva foi de 0,94**. Determinaram-se também as classes de
fertilidade do solo.
Com base na curva de calibração obtida
(classes de fertilidade), e levando-se em conta a relação entre o preço da
tonelada de cana e o preço do quilograma de P2O5 , foi
possível estabelecer recomendação econômica de adubação fosfatada para a cana
planta nos estados de Paraná, São Paulo, Sul de Minas Gerais, Mato Grosso e
Goiás, que variou de 0 a 110 kg de P2O5/ha.
INTRODUÇÃO
O resultado da análise de solo considerado isoladamente, não apresenta maior utilidade, salvo nos casos de extrema carência ou excesso do nutriente considerado. É de grande valia, por outro lado, o conhecimento da relação entre teor de nutriente no solo e a produção agrícola ou outra variável a ela relacionada. Assim, maior será a probabilidade de acerto na interpretação dos resultados da análise química do solo, evitando-se o uso de padrões gerais de fertilidade.
O estudo de calibração de análise de solo envolve várias etapas, sendo o objetivo final determinar a relação entre o teor de nutriente presente no solo e a quantidade de fertilizante a ser utilizada, de modo a obter-se a máxima produção econômica. Torna-se imperativo, portanto, um grande número de ensaios de campo, de maneira a incluir os diferentes níveis do elemento estudado nos solos da região, na qual os resultados do estudo de calibração vão ser aplicados.
Segundo THOMAS & PEASLEE (14) para se converter teores de fósforo determinados no solo em recomendações de fertilizantes, dois tipos de informações são necessárias:
· teor de fósforo no solo, que proporcione o máximo lucro por Unidade de área. Trata-se de caracterizar os resultados analíticos, possibilitando avaliar suas magnitudes;
· a quantidade de fertilizantes necessária para atingir o nível de fósforo no solo que proporcione a máxima produção econômica.
A seleção do extrator usado na análise de solo baseia-se no grau de correlação que se obtém comparando o teor de nutriente no solo com a resposta da planta em termos de produtividade. No Brasil, os extratores mais comuns para fósforo são o H2SO4 0,5N - CATANI & JACINTHO (6) e o da "Carolina do Norte", HC1 0,05N +H2SO4 0,025N - NELSON et alii (l2).
Para o Estado de São Paulo e particularmente para a cana-de-açúcar, BITTENCOURT et alii (14), comparando diversos extratores de fósforo, inclusive soluções de H2SO4 a diversas concentrações, recomendam como mais apropriado o H2SO4 0,5N, sugerindo como nível crítico o valor de 30 ppm de P para uma produção relativa de 90%. Mais tarde, MANHÃES(9) observou que para a região de Campos, RJ, o H2SO4 0,5N mostrou-se satisfatório para extração de fósforo do solo, com relação à cana-de-açúcar.
A calibração do P do solo foi realizada em diversos países, onde os autores utilizaram diferentes extratores, BAVER & AYRES(2), MONTEITH(ll) e JUANG & FANG(8).
No Brasil, o primeiro trabalho de calibração do fósforo para a cana-de-açúcar foi realizado em Pernambuco por STRAUSS(13). Posteriormente, MARINHO & ALBUQUERQUE (10), utilizando o extrator de Mehlich, realizaram a calibração do fósforo no Estado de Alagoas, visando a cana planta, onde o nível crítico foi de 9 ppm de P. AZEREDO et alii(7), utilizando o H2SO4 0,5N como extrator, determinaram o nível crítico de 28 ppm de P no solo, para a produção relativa de 90%.
O objetivo do presente trabalho é correlacionar os teores de fósforo no solo (extraído com H2SO4, 0,5N) com as produções de cana planta. Em função dos índices de fertilidade do solo e da relação w/t (preço da t cana/preço do kg P2O5), serão indicadas as recomendações econômicas de fertilizantes fosfatados.
MATERIAIS E MÉTODOS
A relação entre o teor de fósforo no solo e a produtividade relativa da cana obtida no ensaio de campo, pode ser obtida através de uma modificação da lei de Mitscherlich, proposta por BRAY(5). A equação utilizada é a seguinte:
Log (A-Y) = log A - C x X , na
qual: (1)
A = produção relativa máxima igual a l00%
Y = produção relativa do tratamento em estudo
X =teor de nutriente do solo considerado e
C = constante.
Cada ensaio de campo forneceu um valor de "Y" e outro de "X", os quais, levados à equação (1), possibilitaram o calculo do coeficiente "C". Ao final, obtém-se um valor "C" médio a partir dos coeficientes calculados individualmente.
Os resultados que possibilitaram o estabelecimento da curva de calibração para fósforo foram provenientes de 34 ensaios instalados em diversos solos das áreas canavieiras da Região Centro Sul. As parcelas experimentais constaram de quatro linhas de cana de 20 metros de comprimento e a colheita foi realizada após 16 meses de ciclo, onde utilizaram-se apenas das duas linhas centrais.
Os tratamentos básicos empregados foram: adubação NPK e adubação NK. Os fertilizantes foram aplicados no sulco de plantio, nas seguintes dosagens: 80 kg N/ha através da uréia; 150 kg de P2O5/ha na forma de superfosfato triplo e 150kg de K2O/ha como cloreto de potássio.
Antecedendo-se às adubações, amostrou-se o solo em cinco pontos ao acaso em cada parcela, obtendo-se uma amostra composta final. O fósforo foi analisado no extrator H2SO4 0,5N, pelo método do azul de molibdênio, empregando-se relação solo: extrator de l:l0, BITTENCOURT et alii(4).
As doses econômicas de P2O5/ha foram calculadas através da seguinte equação proposta por GOMES(7):
X* = Xu/2 + 1/C x log w/t x u /Xu (2)
X* = dose econômica de P2O5 em kg/ha;
Xu = dose de P2O5 (em kg/ha) necessária para proporcionar o aumento u;
u = diferença de produtividade entre a produção re1ativa máxima (l00%), fixada arbitrariamente em 120 t cana/ha, e as produtividades relativas referentes a cada classe de fertilidade;
w/t = re1ação entre o preço da tonelada de cana e o preço do quilograma de P2O5 e
C = Constante obtida na equação (1)
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Figura 1 mostra a curva de calibração obtida no presente estudo e os pontos experimentais. O coeficiente de correlação foi de 0,94%**.O valor médio de "C" obtido foi igual a 0,0305, de modo que a equação (1) , para o caso particular da calibração do fósforo no solo, se apresente como:
log (100 – PR%) = 2 - 0,0305 P, onde:
e P = teor de fósforo no solo, expresso em ppm de P.
As classes (índices) de fertilidade do solo foram obtidas a partir da curva de calibração (Figura 1), utilizando-se critério até certo ponto semelhante ao de MARINHO & ALBUQUERQUE(10): muito baixa (PR inferior a 70%); baixa (PR entre 70 e 90%); média (PR entre 90 e 98%); alta (entre 98% e o dobro deste valor em termos de ppm de P), e muito alta (valores acima do dobro da produção relativa de 98%, em termos de ppm de P).
Figura 1. Relação entre produção relativa de cana e fósforo determinado no solo (ppm P).
O nível crítico de P no solo, considerando-se a produção relativa de 90%, foi de 33 ppm de P, bastante próximo ao valor de 30 ppm obtido por BITTENCOURT et alii(4) e de 28 ppm , por AZEREDO et alii(1) na Região de Campos (Rio de Janeiro).
Uma vez que os demais autores (BAVER & AYRES(2); MONTEITH(11); JUANG & FANG(8) e MARINHO & ALBUQUERQUE(10)), trabalharam com diferentes extratores, fica difícil uma comparação de seus resultados com os obtidos no presente trabalho.
As recomendações de adubação fosfatada para a cana planta, observando-se as classes de fertilidade e a relação w/t (preço da tonelada cana/preço do quilograma P2O5), são indicadas na Tabela 1 (essa tabela não constava do original da Revista Brasil Açucareiro).É interessante observar que no presente trabalho não foram considerados os solos de cerrado, onde provavelmente serão necessárias quantidades superiores de fósforo. Observa-se que as dosagens econômicas de P2O5/ha variaram de 0 a 110 kg, valores estes inferiores aos mostrados por MARINHO & ALBUQUERQUE(l0) e AZEREDO et alii(l).
A recomendação fosfatada, para classe de fertilidade "alta", foi realizada levando-se em consideração a quantidade de fósforo extraída por 120 t cana/ha, e objetiva manter a fertilidade natural do solo.
A Figura 2 apresenta graficamente as recomendações de fertilizantes fosfatados, através da variação contínua da relação w/t entre valores de 15 a 35.
Figura. 2: Recomendação de adubação fosfatada em função da relação w/t (preço t cana / preço kg P2O5).
CONCLUSÕES
Através das considerações anteriormente realizadas, conclui-se que:
· H2SO4 0,5N pode ser utilizado com sucesso nas análises químicas do solo, como extrator de fósforo para a cana-de-açúcar;
· O nível crítico encontrado para a cana-de-açúcar foi de 33 ppm de P para produção relativa de 90%;
· Foram estabelecidas as classes de fertilidade do solo: muito baixa (<17 ppm de P), baixa (17-33 ppm de P), média (33-56 ppm de P), alta (56-111 ppm de P) e muito alta (> 111 ppm de P), onde as recomendações econômicas de fósforo variaram de 0 a 110 kg P2O5/ha.
SUMMARY
The high cost of fertilizers
suggests their utilization at leveIs sufficient and necessary to obtain the
maximum economical yields. The present work shows the results of a soil
analysis calibration study for phosphorus. A calibration curve was obtained
through the correlation between soil P (H2SO4 0.5N) extractant)
and relative cane yields. Data from 34 field trials were used, and the ppm P
correlation coeficient was 0.94**.
The soil fertility indexes were
also determined. Based on the soil fertility indexes and considering the ratio
price ton cane/price kg P2O5, it was possible
to establish economic recommendations of phosphorus fertilization for plant
cane in the center south region of Brazil, ranging from 0 to 110 kg P2O5/ha.
1.
trabalho originalmente
publicado na revista Brasil Açucareiro – Rio de Janeiro (3): 38/43, março de
1981.
* Eng Agr, M.S., Chefe da Seção de
Solos e Adubação da Coord. Regional Sul do IAA/ PLANALSUCAR.
** Eng Agr, Dr., Supervisor da área de
Solos e Adubação do IAA/PLANALSUCAR.
*** Eng Agr, M.S., Seção de Solos e Adubação
da Coordenadoria Regional Sul do IAA/ PLANALSUCAR.
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